Comportamento

Mais vale cumprir o próprio dharma

Dharma

 “Mais vale cumprir o próprio dharma, ainda que de forma imperfeita, do que cumprir de maneira perfeita o dever de outrem.”

Bhagavad Gita (III:35)

 

Minha viagem certeira em direção ao que sempre busquei aconteceu em novembro de 2014; uma viagem para a Índia quando finalmente me dei conta de que queria que o yoga fosse um pouco mais que minha prática (física) diária. Ali, mentalizei que queria ser um instrumento daquele modo de viver, mesmo ainda não sabendo de que maneira (ou será que eu já sabia?).

O que sempre falou mais alto era viver de forma mais simples e não aspirar estar em camadas sociais consideradas superiores. Isso me levou às seguintes perguntas: o que é realização? O que é sucesso?

Mas a preparação para essa viagem começou muito antes. Esta questão profissional sempre foi algo que me inquietou. Sou Publicitária, mas muitas vezes achei que os valores, aparentemente tão comerciais da Publicidade eram incompatíveis com aquilo que eu acreditava ser um bom caminho: a colaboração, a preservação, a reutilização, a busca mais espiritual que material. Sem condenar, sem fazer juízo de valor, o que sempre falou mais alto dentro de mim era viver de forma mais simples (não simplória!) e não aspirar estar em camadas sociais consideradas superiores. Esse pensamento do que é superior, de pensar ser superior, me levou às seguintes perguntas: o que é realização? O que é sucesso?

Conversei com amigos, li artigos, entrevistas, blogs, para tentar entender as minhas próprias angústias, e compreendi que essas eram perguntas com respostas muito pessoais e que, enquanto muitos se encantam com a vida na cidade, com o trabalho em grandes corporações, outros estão voltando para o campo, para uma busca de uma vida mais tranquila e harmônica. Embora pareça clichê, percebi que não há certo nem errado; há o que te preenche e te faz brilhar os olhos.

Depois que voltei de um ano sabático (que tirei justamente por já me questionar sobre que caminho seguir), havia me determinado a dar aulas de inglês e de yoga, mas meus medos e, por trás deles meu ego, falaram mais alto. Achei que precisava daquela certeza no final do mês; achei que ainda precisava mostrar (para quem, hein?) que estava inserida no mercado. Muitas coisas passaram pela minha cabeça como: o que vão pensar de mim? O que fazer com todos os anos de estudo e dedicação à minha profissão?

Decidi seguir minha intuição. Ela está dizendo o tempo todo qual é o caminho, mas muitas vezes não conseguimos escutar porque o barulho interno e os estímulos externos são muitos. É preciso silenciar para ouvir.

Voltei a trabalhar em agência e posso dizer que foi a melhor coisa que me aconteceu: conheci novas pessoas e reencontrei velhos conhecidos, alguns deles com o pensamento parecido com o meu, mas que conseguem equalizar com as demandas da atividade que exercem, o que me ensinou muitas coisas. Por outro lado, ter voltado me fez enxergar que aquilo tudo não fazia mais sentido pra mim, ver as pessoas discutindo, às vezes brigando, culpando uns aos outros (para satisfazer ao que mesmo?) era algo para o que não conseguia ver justificativa. E mais perguntas começaram a gritar dentro de mim e te convido a refletir sobre isso comigo: Qual o sentido do seu trabalho? Como ele modifica positivamente seu entorno e as pessoas que estão ao seu lado? Como ele te modifica? E indo além: o que você faria se não precisasse trabalhar por obrigação ou por dinheiro?

Me lembrei que havia pedido para o Universo (para Deus, ou providência, essa energia que ultrapassa meu entendimento) me levar para onde eu fosse desenvolver meu dharma e decidi seguir minha intuição. A intuição está dizendo o tempo todo qual é o caminho, mas muitas vezes não conseguimos escutar porque o barulho interno e os estímulos externos são muitos. É preciso silenciar para ouvir. Saí da agência sem ter trabalho certo, mas entendendo a minha decisão como escolha e não como fracasso. E essa decisão ganhou ainda mais força ao entender que meus filhos, especialmente o mais novo, um bebê de 1 ano, mereciam a presença de uma mãe feliz.

As perguntas continuam; são inquietações que devem nos mover. Entretanto, uma delas, a meu ver, é a mais importante: estou feliz?

Não estou dizendo que é fácil; ao contrário! É preciso coragem para mudar, mas é preciso compaixão para conosco para também lidar com o custo emocional que isso traz. Até porque, o primeiro impacto é financeiro e é óbvio que muitas coisas que gostamos envolvem dinheiro; precisamos do dinheiro para muitas coisas e aprender a lidar com ele também tem sido um exercício. Não é não querer, é não entendê-lo como motivador principal do meu trabalho. É conseguir exercitar o desapego sempre me questionando: do que eu realmente preciso?

Há quase dois meses voltei ao meu caminho com o coração cheio de gratidão. Dou aulas de yoga e estudo Ayurveda – sistema de cura tradicional indiano. Me dedico à prática de Ashtanga Yoga e busco auto conhecimento sem entender que isso me faz melhor que qualquer pessoa, mas entendendo que hoje sou um pouco melhor para mim. As perguntas continuam; acho que elas não devem cessar nunca, são inquietações que devem nos mover. Entretanto, uma delas, a meu ver, é a mais importante: estou feliz?

 

 

Tatiana Chaves

Tatiana Chaves é mestre em Comunicação e Semiótica pela PUC de São Paulo. É mãe de dois meninos e busca, através do yoga, encontrar o equilíbrio necessário para reafirmar diariamente sua escolha pela simplicidade em meio à espetacularização e gourmetização da vida.

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