Comportamento

Vida simples ou simplória

Vida simples3

Estava um dia desses assistindo a um vídeo em que Mário Sérgio Cortella (filósofo, escritor e educador) falava sobre a diferença entre uma vida simples e uma vida simplória. Obviamente que o tema me chamou a atenção, especialmente pela escolha que fiz de ter uma vida mais simples desde que voltei da Irlanda onde morei por um ano e meio.

Com a vida simples que escolhi levar com minha família, o salário diminuiu, muitos dos que diziam ser meus amigos se afastaram, mas por outro lado, tenho mais tempo para ficar com meus filhos, fazer experimentos culinários, ler um livro, meditar e estar com quem também fez a escolha de ficar na minha vida.

A vida simples que escolhi levar com minha família começou quando decidi deixar minha profissão de publicitária para dar aula de yoga e inglês. O salário diminuiu, muitos dos que diziam ser meus amigos se afastaram, mas por outro lado, tenho mais tempo para ficar com meus filhos, fazer experimentos culinários, ler um livro, meditar e estar com quem também fez a escolha de ficar na minha vida.

Entretanto, mais do que a diferença conceitual em si, o que me chamou a atenção foi quando ele citou uma frase, um dito popular antigo, que diz: “o mundo que deixaremos para nossos filhos depende muito dos filhos que deixaremos para o mundo”. Quem me conhece sabe o quanto foi difícil tomar a decisão de ser mãe novamente depois de 17 anos. Muito da minha resistência passava justamente pela preocupação em ter uma criança e tentar dar a ela uma boa educação, que passa pela educação formal, sem dúvida, mas não para por aí e vai muito além, ou melhor, começa muito antes da criança sequer ter pisado na escola. E é neste ponto que o tema vida simples/vida simplória ecoa.

Como Cortella diz, uma vida simples é aquela em que temos o suficiente para nós e também para repartir, ou seja, uma vida simples não é uma vida de carência, mas também passa muito longe de uma vida de desperdícios . Uma vida simples é aquela em que eu possuo as coisas, e não aquela em que as coisas me possuem, o que significaria estar escravizado por elas. E quando se trata dos filhos, o que tenho visto é exatamente isto: um consumo sem medida de necessidades inventadas.

Depois que engravidei passei a ver, a ler e a ouvir muitas coisas sobre crianças e algumas delas me causam se não um estranhamento, certamente alguma preocupação. Coisas como chá de revelação, recepção com decoração e salgadinhos na maternidade e todas as regras de como se deve ou não se deve criar um filho me soam tão artificiais que me parece que têm tirado nossa naturalidade e leveza. Sem falar das festinhas de aniversário que agora começaram mais cedo com direito a bolo, docinhos e decoração diferenciada a cada mês até que a criança complete 1 ano. E aí, quando esta data chega, não há dinheiro que vença o nível de criatividade (e, diga-se de passagem, de desperdício) a que se pode chegar. Li um artigo que fazia uma crítica exatamente a esse exagero das festinhas infantis em que há até contratação de limusines para comemorar o aniversário de meninas de 7-8 anos!

Depois que engravidei passei a ver muitas coisas que me causaram estranhamento. Coisas como chá de revelação, recepção com decoração e salgadinhos na maternidade e todas as regras de como se deve ou não criar um filho me soam tão artificiais que têm tirado nossa naturalidade e leveza.

E antes que pareça, eu não sou contra o dinheiro e as coisas que ele pode comprar, até porque, se não há suficiência, não se pode sequer optar por ter uma vida simples no sentido de que estamos tratando. Também não tenho nada contra as festinhas que mencionei acima, já que a vida sempre merece ser celebrada. O que questiono é a motivação para certas ostentações (realmente preciso disto ou preciso mostrar isto?) e, em casos mais extremos, me pergunto como impor limite às crianças quando os próprios pais não o tem para essas pequenas coisas.

No mais, nessa minha vontade de ter uma vida simples, mas não simplória, fico pensando nos valores que quero ensinar aos meus filhos de modo a encontrar um equilíbrio entre o que há para consumir e o que há para fruir, entre o vídeo game e o banho de chuva, entre um show pirotécnico e um lual com os amigos, entre ser ambicioso e sonhar, entre o ter e o ser.

Tatiana Chaves

Tatiana Chaves é mestre em Comunicação e Semiótica pela PUC de São Paulo. É mãe de dois meninos e busca, através do yoga, encontrar o equilíbrio necessário para reafirmar diariamente sua escolha pela simplicidade em meio à espetacularização e gourmetização da vida.

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